Parnasianismo

"O Parnasianismo foi vítima da inteligência que construiu a prisão onde quis encarcerar o poeta."
Rubens B. Morais
I- Introdução:
O parnasianismo foi um movimento literário que surgiu na França, na metade do século XIX e se desenvolveu na literatura européia, chegando ao Brasil. Esta escola literária foi uma oposição ao Romantismo, pois representou a valorização da ciência e do positivismo.
O nome Parnasianismo deriva do termo "Parnasmo" que na mitologia grega era o monte do deus Apólo e das musas da poesia. Os poetas parnasianos que mais se destacaram foram: Théophile Gautier, Leconte de Lisle, Théodore de Banville e José Maria de Heredia.
II- Características do Parnasianismo:
 Preciosismo: focaliza-se o detalhe; cada objeto deve singularizar-se, daí as palavras raras e rimas ricas na poesia.
 Objetividade e impessoalidade: o poeta apresenta o fato, a personagem, as coisas como são e acontecem na realidade, sem deformá-los pela sua maneira pessoal de ver, sentir e pensar. Esta posição combate o exagerado subjetivismo romântico.
 Arte pela arte: a poesia vale por si mesma, não tem nenhum tipo de compromisso, e se justifica por sua beleza. Faz referência ao prosaico, e o texto mostra interesse a coisas pertinentes a todos.
 Estética: Como os poemas não assumem nenhum tipo de compromisso, a estética é muito valorizada. O poeta parnasiano busca a perfeição formal a todo custo, e por vezes, se mostra incapaz para tal.


III - Aspectos importantes para a estética perfeita:
 Rimas ricas: São evitadas palavras da mesma classe gramatical. Há uma ênfase das rimas do tipo ABAB para estrofes de quatro versos, porém também muito usada às rimas interpoladas.
 Valorização dos sonetos: É dada preferência para os sonetos, composição dividida em duas estrofes de quatro versos, e duas estrofes de três versos. Revelando, no entanto, a "chave" do texto no último verso.
 Metrificação rigorosa: O número de sílabas poéticas deve ser o mesmo em cada verso, preferencialmente com dez (decassílabos) ou doze sílabas (versos alexandrinos), os mais utilizados no período. Ou apresentar uma simetria constante, exemplo: primeiro verso de dez sílabas, segundo de seis sílabas, terceiro de dez sílabas, quarto com seis sílabas, etc.
 Descritivismo: Grande parte da poesia parnasiana é baseada em objetos inertes, sempre optando pelos que exigem uma descrição bem detalhada como e “A estátua”, "Vaso chinês" de Alberto de Oliveira.
 Temática Greco-Romana- A estética é muito valorizada no Parnasianismo, mas mesmo assim, o texto precisa de um conteúdo. A temática abordada pelos parnasianos recupera temas da Antiguidade Clássica, características de sua história e sua mitologia. É bem comum os textos descreverem deuses, heróis, fatos lendários, personagens marcados na história e até mesmo objetos.
 Cavalgamento ou encadeamento sintático (enjambement)- Ocorre quando o verso termina quanto à métrica (pois chegou na décima sílaba), mas não terminou quanto à idéia, quanto ao conteúdo, que se encerra no verso de baixo. O verso depende do contexto para ser entendido. Tática para priorizar a métrica e o conjunto de rimas. Como exemplo, este verso de Olavo Bilac:
Cheguei, chegaste. Vinhas fatigada e triste. E triste e fatigado eu vinha.
IV- Parnasianismo no Brasil:
No Brasil, o parnasianismo dominou a poesia até a chegada do Modernismo brasileiro. A importância deste movimento no país deve-se não só ao elevado número de poetas, mas também a extensão de sua influência, uma vez que seus princípios estéticos dominaram por muito tempo a vida literária do país.
Nessa década de 1879, a poesia romântica deu mostras de cansaço, e mesmo em Castro Alves é possível apontar elementos precursores de uma poesia realista. Assim, entre 1870 e 1880 assistiu-se no Brasil à liquidação do Romantismo, submetido a uma crítica severa por parte das gerações emergentes, insatisfeitas com sua estética e em busca de novas formas de arte, inspiradas nos ideais positivistas e realistas do momento.
Dessa maneira, a década de 1880 abriu-se para a poesia científica, a socialista e a realista, primeiras manifestações da reforma que acabou por se impulsionar para o Parnasianismo. As influências iniciais foram Gonçalves Crespo e Artur de Oliveira, este o principal propagandista do movimento a partir de 1877, quando chegou de uma estada em Paris. O Parnasianismo surgiu timidamente no Brasil nos versos de Luíz Guimarães Júnior (sonetos e rimas, 1880) e Teófilo Dias (Fanfarras, 1882), e firmou-se definitivamente com Raimundo Correia (Sinfonias, 1883), Alberto de Oliveira (Meridionais, 1884) e Olavo Bilac (Relicário, 1888).
O Parnasianismo brasileiro, a despeito da grande influência que recebeu do Parnasianismo francês, não é uma exata reprodução dele, pois não obedece à mesma preocupação de objetividade, de cientificismo e de descrições realistas. Foge do sentimentalismo romântico, mas não exclui o subjetivismo. Sua preferência dominante é pelo verso alexandrino de tipo francês, com rimas rica, e pelas formas fixas, em especial o soneto. Quanto ao assunto, caracteriza-se pela objetividade, o universalismo e o esteticismo. Este último exige uma forma perfeita (formalismo) quanto à construção e à sintaxe. Os poetas parnasianos vêem o homem preso à matéria, sem possibilidade de liberta-se do determinismo, e tendem então para o pessimismo ou para o sensualismo.
A partir de 1890, o Simbolismo começou a superar o Parnasianismo. O realismo clássico do Parnasianismo teve grande aceitação no Brasil, graças certamente à facilidade oferecida por sua poética, mais de técnica e forma que de inspiração e essência. Assim, ele foi muito além de seus limites cronológicos e se manteve paralelo ao Simbolismo e mesmo ao Modernismo em sua primeira fase.
O prestígio dos poetas parnasianos, ao final do século XIX, fez de seu movimento a escola oficial das letras no país durante muito tempo. Os próprios poetas simbolistas foram excluídos da Academia Brasileira de Letras, quando esta se constituiu, em 1896. Em contato com o Simbolismo, o Parnasianismo deu lugar, nas duas primeiras décadas do século XX, a uma poesia sincretista e de transição.
V- Autores do Parnasianismo

Olavo Bilac (1865-1918): formado em Medicina, o menino Bilac teve sua infância povoada de histórias de batalhas e hinos militares, pois seu pai participara da Guerra do Paraguai. Após 1888, com a publicação de Poesias, passaa dedicar-se ao jornalismo e à literatura.
Defendeu o serviço militar obrigatório, como fator de civismo, e alfabetização. Foi um patriota convicto; é dele a letra do Hino à Bandeira. Foi defensor do abolicionismo e da República e colocou-se contra a ditadura de Floriano Peixoto (exilado em Ouro Preto por suas críticas). Foi contra a neutralidade do Brasil na guerra de 1914. Sempre escreveu para a imprensa, tendo colaborado no jornal A Gazeta de Notícias e em revistas: A Semana, A Cigarra etc.
Único parnasiano que já se iniciou na estética do movimento, Bilac foi um dos fundadores da A.B.L; foi eleito Príncipe dos Poetas Brasileiros.
A mulher e a pátria são temas constantes nas obras de Bilac.
Coerente com sua postura estética, sua forma é perfeita, demonstrando habilidade de versificação e pureza da língua. Sua poesia é superficial das cores, dos sons, das combinações plásticas sem mergulhar nas angústias e prazeres do ser humano.
Obras principais:
 Poesia- pode ser dividida em temas:
• volta a Antiguidade Clássica- "Panóplias", "A Sesta de Nero", "O Incêndio de Roma", "Lendo a Ílidia" e outros.
• lirismo- "35 sonetos de Via Láctea" e "Nel Mezzo del Camin" (cheio de pleonasmos e inversões).
• filosófico, de meditação- "Alma Inquieta" e "Viagens"
• épico- " O Caçador de Esmeraldas" e "Viagens" (bandeirantes em terras mineiras)
• descritivo e nacionalista- "Crepúsculo na Mata" (descritivo), "Anchieta" e "Vila Rica" (volta ao passado histórico)
• consciência do fim- "Tarde"

 Prosa:
Crônicas e Novelas (1894), Crítica e Fantasia (1904), Contos Pátrios (1905), Teatro Infantil (1905), Tratado de Versificação(1905, em colaboração com Guimarães Passos), Conferências Literárias (1906), A Defesa Nacional (1917), Ironia e Piedade (1916), Bocage (1917), Últimas Conferências e Discursos (1927), Livro de Literatura (1899).
Alberto de Oliveira (1857-1937): Formado em medicina mantém profunda amizade com Olavo Bilac e Raimundo Correia.É um dos sócios fundadores da ABL, sendo também eleito Príncipe dos Poetas após a morte de Bilac.
Sempre permaneceu fiel ao Parnasianismo e à margem dos acontecimentos históricos. É considerado mestre na estética, com sua temática presa à descrição, desde a natureza até meros objetos, exaltando-lhes a forma. Perfeição formal, métrica rígida e linguagem extremamente trabalhanda, chegando, por vezes,ao rebuscamento.
Sua obra revela uma gradativa evolução, passando de uma linguagem difícil, vinculada aos temas exóticos de mitologia greco-latina para uma linguagem mais clara e ligada aos temas brasileiros. Revela um gosto especial pela descrição, como nos poemas "O Muro", "A Estátua", "O Vaso Grego" e etc. Em sua obra, a mulher e a natureza são vistas a partir de uma concepção estética muito rígida.
Obras principais: Cancões Românticas (1878), Meridionais(1884), Sonetos e Poemas (1885), Versos e Rimas (1895), Poesias Completas (1900), Poesias (1927), Poesias Escolhidas(1913) e etc.
Raimundo Correia (1860-1911): Formado em Advocacia, lecionou em quase toda a vida. Tem seu livro Sinfonias (1883), completamente parnasiano, publicado com prefácio de Machado de Assis. Também é sócio fundador da ABL.
Era tímido e triste, sua saúde era debilitada, tendo viajado para a França, à procura de tratamento, quando lá encontrou a morte.
Forma a Trindade Parnasiana com Bilac e Alberto de Oliveira. Mantém assim a temática do movimento, destacando-se a poesia filosófica, de meditação, marcada pela desilusão, o fim do sonho e um forte pessimismo. Tem fortes influências impressionistas.
Afirmam que Raimundo Correia versejava com tanta facilidade que chegavaa escrever em verso as cartas aos familiares. Seus poemas revelam influência do pessimismo de Schopenhauer. A sua percepção negativa do mundo pode ser vista principalmente em "Nirvana", "Imagem da Dor", "Desiludido".
Obras principais: Primeiros Sonhos (1879), Sinfonias (1883), Versos e Versões (1887), Aleluias (1891), Poesias (1898), Luciano Filho (1898).
4- Vicente de Carvalho (1860-1911): Formado em Direito, era republicano e abolicionista. Foi político, advogado e magistrado. Além disso, dedicou-se à agricultura e ao comércio. Ficou sendo conhecido como "O poeta do mar".
Obras principais: Ardentias (1885), Relicário (1888), Rosa de Amor (1902), Poemas e Canções (1908), Páginas Soltas (1911) e Luizinha (1924).
VI- Análise de algumas obras parnasianas:

Via Láctea

"Ora (direis) ouvir estrelas! Certo
Perdeste o senso"! E eu vos direi, no entanto,
Que, para ouvi-las, muita vez desperto
E abro as janelas, pálido de espanto...

E conversamos toda a noite, enquanto
A via láctea, como um pálio aberto,
Cintila. E, ao vir do sol, saudoso e em pranto,
Inda as procuro pelo céu deserto.

Direis agora! "Tresloucado amigo!
Que conversas com elas? Que sentido
Tem o que dizem, quando estão contigo?"

E eu vos direi: "Amai para entendê-las:
Pois só quem ama pode ter ouvido
Capaz de ouvir e de entender estrelas".

(Olavo Bilac)
Análise da poesia "Via Láctea": A sensibilidade dos poetas em entender aquilo que o coração e os sentidos teimam em revelar, muitas vezes pode ser considerado loucura por aqueles que não conhecem aquilo que evoca esse sentimento "louco" nos enamorados... ora, aquele que conhece o amor e tudo o mais que ele exala, certamente não se importará de ser chamado "tresloucado"... Olavo Bilac neste soneto revela seu sentimento mais profundo ante o amor e ante aqueles que não o compreendem... seu conselho mais tenro? "Amai para entendê-las"!

Mal Secreto

Se a cólera que espuma, a dor que mora
N’alma, e destrói cada ilusão que nasce,
Tudo o que punge, tudo o que devora
O coração, no rosto se estampasse;

Se se pudesse o espírito que chora
Ver através da máscara da face,

Quanta gente, talvez, que inveja agora
Nos causa, então piedade nos causasse!

Quanta gente que ri, talvez, consigo
Guarda um atroz, recôndito inimigo,
Como invisível chaga cancerosa!

Quanta gente que ri, talvez existe,
Cuja a ventura única consiste
Em parecer aos outros venturosa!

(Raimundo Correia)
Análise da obra "Mal Secreto": Em Mal secreto, Raimundo Correia utiliza-se de rima do tipo ABAB nas duas primeiras estrofes, e do tipo CCD nas duas últimas estrofes. A forma utilizada pelo poeta foi a de Soneto, largamente utilizada pelos parnasianos e pela tríade. Em relação à métrica, Raimundo Correia opta por versos decassílabos, também muito utilizado pelos poetas parnasianos.
Raimundo Correia utiliza-se também de recursos sonoros e visuais: O ritmo marcado pela sonoridade, especialmente nas palavras tônicas, e nas rimas a marca do tom consistente e forte. Através desses recursos, o poeta consegue transmitir sua oposição semântica fundamental dentro do poema, entre o íntimo do ser humano e sua aparência, com as máscaras que muitas vezes escondem a realidade.